O Presidente da República esteve reunido com representantes juvenis. E o ovo de João Lourenço, versão do MPLA para o ovo de Colombo, foi apresentado. A solução está nas mãos dos privados, sobretudo se forem estrangeiros. Em síntese, a pedra filosofal está em privatizar tudo, falir o reino enquanto Estado/país/nação e…. fugir com a massa.
O Presidente apresentou-se hoje como “o jovem João Lourenço”, num encontro com representantes dos jovens, que começou com um minuto de silêncio em memória de Inocêncio de Matos, morto na sequência da manifestação de 11 de Novembro. Se a hipocrisia matasse, o MPLA já não existiria.
João Lourenço não tinha até agora feito qualquer declaração sobre a morte, que testemunhas e a família atribuem à polícia, contradizendo a versão oficial do hospital Américo Boavida, que aponta para “ofensa corporal” com “objecto contundente não especificado”, ou seja, uma bala.
O chefe de Estado focou o “momento difícil” que se vive em Angola devido à crise económico-financeira associada ao baixo preço do principal produto de exportação de Angola, o petróleo, bem como o elevado nível de endividamento externo do país, agravados pelo desafio da pandemia de Covid-19. Quem diria? Pois.
“Num quadro destes é natural que as preocupações dos jovens aumentem”, salientou, considerando que esta faixa etária será das que mais sente dificuldades, como a falta de emprego ou a escassez de habitação.
João Lourenço afirmou que o encontro com os jovens serve precisamente para que esses façam ouvir as suas preocupações directamente ao poder, sendo uma forma de se manifestarem, alternativa aos protestos na rua. Por outras palavras, talvez os protestos (ou estes encontros propagandísticos) sirvam para criar empregos e edificar casas.
Esta é a terceira edição dos diálogos do Presidente angolano com supostos representantes juvenis, depois de ter passado pelas províncias do Bié e do Zaire. Desta forma ficaram, por exemplo, a saber que Jorge Valentim (antigo dirigente da UNITA) levava comida ao pai de João Lourenço quando este estava preso pela PIDE…
Não se ficou a saber, mas o Folha 8 recorda, que analistas internacionais, bem como nacionais, consideram que o primeiro de muitos mandatos de João Lourenço se saldará por um monumental fracasso económico, apenas compensado pelo também monumental êxito a nível da propaganda e de penhorar o país para garantir o fiado.
João Lourenço garante que o conjunto de peritos a que se chama “Executivo” está a trabalhar para restaurar a confiança dos investidores privados (se possível estrangeiros) e, variável fundamental para que o país possa retomar (quem diria, não é?) a trajectória do crescimento económico interrompido nos últimos cinco anos por força da crise.
Vejamos se, desta vez, não vai acontecer com os investidores privados o que aconteceu sobejas vezes ao longo dos anos. Ou seja, o Estado/MPLA entra com a experiência e os investidores com o dinheiro, e no fim fica o Estado/MPLA com o dinheiro e os investidores com a experiência… e com o país.
O Presidente afirmou que as manifestações “não têm de acabar em violência”, assinalando que este direito está limitado temporariamente devido à pandemia de Covid-19, tal como as idas à praia ou as festas de casamento, acrescentando que “nos últimos dias, os jovens têm feito uso de várias formas de fazer chegar ao poder as suas preocupações”, entre as quais as manifestações, onde transmitem as suas mensagens e preocupações através de cartazes.
“Isto é universal e em Angola também é assim, é um direito protegido pela Constituição e nenhum poder pode tirar esse direito aos cidadãos”, salientou. Ninguém pode tirar esse direito? Foi mesmo isso que Eugénio Laborinho, perdão, João Lourenço disse? Pois é. De imediato veio o decreto Presidencial: “As coisas na vida não são tão lineares e uma coisa é termos o direito, outra é beneficiar dele”.
Do alto do seu diferente cadeirão, o Presidente explicou que “o executivo tem obrigação de proteger o bem mais precioso que é a vida do ser humano”, mesmo que para isso tenha de anular, ou limitar, os direitos dos cidadãos, como a circulação interprovincial, já que Luanda está sob cerca sanitária, ir à praia ou dar festas de casamento que os angolanos também estão impedidos de usufruir.
“Se manifestação equivale a ajuntamento, esse não deve ter lugar sob pena de contribuir para a propagação da Covid”, afirmou João Lourenço, sublinhando que quer evitar o colapso das unidades de saúde devido à doença e, claro, aos ajuntamentos (leia-se manifestações).
João Lourenço, modesto até dizer basta, disse: “Apelamos que seja toda a sociedade angolana a fazer o mesmo esforço, o mesmo sacrifício, para evitar chegar à situação de colapso. Uma vez que estamos a impedir os cidadãos de exercer os seus direitos de manifestação, de fazer chegar as suas mensagens [ao poder], entendemos encontrar uma forma alternativa que não viole o decreto presidencial, que é esta”.
Com a pedagogia dos grandes estadistas (que pensa ser o seu caso) João Lourenço afirmou que “o que muda é a forma de o fazer, aqui também estão a manifestar-se através das vossas intervenções, se calhar melhor, com mais calma, sem barulho, sem queimar pneus, vão poder se manifestar, vão fazer chegar em primeira mão à mais alta instância do poder aquilo que vos aflige”.
“Não há necessidade de nenhuma das partes, nem dos manifestantes nem das autoridades que têm obrigação de acompanhar as manifestações, mas é necessário que ninguém espolete estes momentos”, disse o “escolhido de Deus” (versão II), corroborando que “as autoridades não têm interesse nenhum em tratar mal o povo”. Mas há excepções: “Tudo é relativo, depende do comportamento do cidadão. Para o cidadão se manifestar não precisa de cometer excessos”.
“Alguns dizem que é difícil lidar com a juventude, eu penso que não, até porque também já fui jovem. Nós conhecemos as formas de pensar, de sentir e de agir, o que muda as vezes é a conjuntura, no nosso tempo não havia manifestações, havia outra forma de fazer valer os nossos direitos”, referiu João Lourenço. E fez bem. É que já havia muita gente a pensar que ele nunca foi jovem e que, por isso, já nasceu adulto…
Interpelado pelo dirigente da JPA (organização juvenil da coligação CASA-CE, oposição), Eduardo Garcia, pedindo a “intervenção imediata” do Presidente para que não haja mais mortes de jovens em manifestações, João Lourenço lamentou (até porque já foi jovem) e sublinhou que “não deve haver mortes, pior ainda quando são causadas pela acção directa da polícia a quem foram dadas instruções às autoridades para evitar ao máximo armas de fogo”.
“A nossa posição é que a polícia deve sempre acompanhar a manifestação até para proteger os próprios manifestantes e para proteger o bem público, bem como manter a ordem e sempre que possível deve evitar excessos”, explicou o Presidente.
“Lamentavelmente nem sempre é possível e isso é universal”, prosseguiu, apontando casos recentes em Berlim e os protestos dos “coletes amarelos” em Paris, cujas imagens foram – disse –vistas em todo o mundo porque ao contrário de Angola, dizemos nós, os jornalistas têm liberdade para trabalhar.